Em um nível mais profundo de discussão, ateísmo e fé não são auto-excludentes. O ponto controverso é a hipótese-deus. Ambos, ateu e o religioso de uma denominação qualquer, podem basear concepções sem uma fundamentação completa. Assim, um cidadão comum, medianamente bem-informado, pode acreditar na dualidade onda-partícula, ainda que não tenha a bagagem necessária para investigar os pressupostos em que ela se baseia. A diferença em relação à religião está no fato de que esta última não tolera investigações; sua base dogmática não é questionável sequer nos círculos mais estritos. Exemplo disso é a hierarquia de igreja católica e as sanções aplicáveis aqueles que ousam levantar hipóteses. Em religião, dogmas são menos negociáveis do que em ciência.
O catecismo, exercido sobre crianças que aceitam igualmente deus e papai-noel, é um dos pontos considerados mais delicados da discussão sobre religião. Os limites entre fé legítima e defesa da doutrinação recebida tornam-se difusos: o indivíduo é impregnado pela família e pelo grupo social de uma cultura que não teve a oportunidade de escolher ou recusar. Logicamente, dificilmente terá uma base de análise e argumentação que lhe permita discutir livre e conscientemente o assunto - sejam pinturas na parede da caverna, seja um elaborado ritual em uma catedral. Por fim - e surpreendentemente - argumentos como "falta de fé" e mesmo "influência demoníaca" são empregados com grande freqüência. Cabe notar que esse retorno a um pensamento medieval é mais visível em certas denominações religiosas do que outras.
Para muitos agnósticos e ateus fracos, tanto o teísta quanto o ateu forte estariam baseando suas afirmações na fé, e não no conhecimento. Segue abaixo um pequeno resumo de argumentos acerca da idéia, (aqui o termo ateu será usado como sinônimo de ateu forte).
O ateísmo forte não requer a fé | O ateísmo forte requer fé |
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O ateísmo não é uma crença apoiada em dogmas: ele acabaria se surgisse uma prova irrefutável da existência de entidades divinas. | Nada impede que muitos teístas afirmem que abandonariam suas crenças caso fique provado que seu deus não existe. Isso não faz com que eles deixem de estar apoiados na fé. |
É a crença na existência de algo sem que existam provas a esse respeito que é inaceitável e não o contrário, ou seja, caso não se possa provar que algo existe, deve-se partir do pressuposto de que esse algo não existe. A descrença dos ateus não é equivalente a uma crença, uma vez que o ateísmo só existe como conseqüência da falta de provas e indícios favoráveis à existência de deuses. | É notadamente uma falácia afirmar que, porque uma coisa não foi provada como verdadeira deve ser necessariamente falsa. Para a ciência, todo aquele que afirma algo sobre a realidade passa a ter o ônus da prova. Tanto pessoas que afirmem que um deus existe quanto aquelas que afirmam não haver deuses precisam apresentar provas daquilo que estão dizendo. |
A inexistência de deus não precisa ser provada porque, da maneira como é apresentada pela maioria das religiões, é essencialmente auto-contraditória. Seria logicamente impossível que tal deus exista. | A lógica é freqüentemente usada tanto para tentar negar, quanto para tentar provar a existência de um criador. Até mesmo o pressuposto de que a lógica seria capaz de concluir pela existência ou não de um deus é algo questionável. |
Essa discussão tem muitas facetas e envolvem desde discussões epistemológicas até a própria definição de termos como fé e crença. Não parece provável que surja uma resposta consensual no futuro próximo.
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